OS BANDIDOS AGRADECEM
A cada Campanha Nacional do Desarmamento, como a que
está sendo veiculada, a sociedade fica mais vulnerável, e os bandidos,
mais à vontade. Os argumentos das autoridades permanecem mais ou menos
os mesmos desde 2004, quando essas campanhas começaram: a defesa dos
cidadãos cabe exclusivamente à polícia e disparos acidentais de armas de
fogo provocam tragédias familiares. Não se discute que é preciso
treinamento para manejar armas, como, de resto, é preciso treinamento
para dirigir um carro, cujo mau uso o torna tão letal quanto um
revólver. Já o argumento de que não cabe ao cidadão ter instrumentos
adequados para se defender da ameaça de bandidos armados é ominoso.
O mote da campanha atual é: "Proteja sua família. Desarme-se".
Trata-se de uma série de depoimentos de pais cujos filhos foram vítimas
de disparos acidentais de armas de fogo. A intenção, segundo o
Ministério da Justiça, é mostrar que não vale a pena correr os riscos
que ter uma arma em casa implicam. "A arma é um excelente instrumento de
ataque e um péssimo instrumento de defesa, principalmente para as
pessoas que não têm habilidade em usá-la", disse a secretária nacional
de Segurança Pública, Regina Miki. Segundo ela, "a sociedade tem o
direito de exigir do Estado que qualifique e equipe muito bem os
policiais para defendê-la", pois "essa é competência do policial, e não
do cidadão".
Trata-se de um raciocínio primário. É óbvio que cabe ao Estado
proteger seus cidadãos, pois é o Estado que detém o monopólio do uso
legítimo da força. No entanto, como sabe qualquer cidadão letrado, esse
monopólio tem sido diuturnamente desafiado pelo crime organizado e pela
bandidagem em geral, que mesmo de dentro das penitenciárias conseguem
fazer valer a lei da barbárie. Há cidadãos que desejam ter meios para
enfrentar os criminosos caso os agentes do Estado não estejam por perto
para fazê-lo, situação que é rotineira nas grandes cidades. A lei
faculta a esses indivíduos o direito de proteger a si e a sua família da
melhor maneira possível - é a chamada legítima defesa. Trata-se de uma
questão pessoal, sobre a qual o Estado não pode jamais interferir, pois a
lei não determina que os cidadãos devam ficar inertes ante a violência
que eventualmente sofram.
Mas o discurso das campanhas de desarmamento transformou o ato de se
defender em uma violência equivalente à cometida pelos bandidos - se não
pior, porque os criminosos, de acordo com o sociologuês acadêmico que
pauta esse debate, agem porque são vítimas do "sistema", enquanto os
indivíduos que se defendem usando armas de fogo são, estes sim,
elementos violentos. Somente neste ano, três inocentes que reagiram a
assaltantes armados foram processados por crime de homicídio doloso
triplamente qualificado. Em um dos casos, uma senhora de 86 anos cuja
casa estava sendo assaltada, em Caxias do Sul (RS), pegou um velho
revólver calibre 32 e conseguiu matar o ladrão a tiros. Como a arma não
tinha registro, ela foi indiciada e se tornou ré, apesar de ter somente
tentado proteger sua vida e seu patrimônio. Trata-se de um episódio
exemplar dessa "equalização moral" entre bandidos e vítimas.
Ademais, de que valem campanhas de desarmamento se os bandidos têm
enorme facilidade para obter seu arsenal, até mesmo sob as barbas da
Justiça? Têm sido frequentes os assaltos a fóruns, onde ficam guardadas
as armas e a munição apreendidas e que serão usadas como prova nos
processos. Sem segurança adequada, esses locais são de "fácil acesso"
para os criminosos. O caso mais recente ocorreu em Peruíbe, no litoral
sul de São Paulo, em 2 de dezembro. Havia apenas um vigia no local,
facilmente rendido.
O fato é que as campanhas de desarmamento não são a panaceia contra a
violência, e a interpretação que se faz da legislação vigente trata o
cidadão possuidor de armas como um delinquente. Isso só é possível num
país em que as autoridades, para escamotear sua incompetência na área de
segurança pública, atribuem a responsabilidade por parte da violência à
própria vítima. Os bandidos agradecem.
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